sexta-feira, 21 de setembro de 2007

Cimeira UE/África

Faltam menos de três meses para a realização, em Lisboa, de uma cimeira entre a União Europeia (UE) e África.
O encontro, previsto para 8 de Dezembro, deverá reunir a totalidade dos chefes de Estado ou de governo da UE e dos países africanos, para consagrar politicamente uma nova estratégia comum e permitir várias decisões ao mais alto nível em domínios como as migrações, energia ou combate às alterações climáticas.
Mas, parece que nem a agenda nem o conteúdo das discussões está definido, nem os convites aos líderes foram enviados.
A causa desta indefinição é Robert Mugabe, Presidente do Zimbabwe, cuja eventual presença em Lisboa levanta uma série de vetos em vários países europeus, a começar pelo Reino Unido: Londres tem deixado claro que, se Mugabe participar na cimeira, o primeiro--ministro, Gordon Brown, ficará de fora.
Será um ou o outro, nunca os dois ao mesmo tempo.
Nesta postura os ingleses contam com o apoio explícito da Suécia e, de forma mais discreta, da Holanda e da Dinamarca.
Esta animosidade está relacionada com as acusações que pendem sobre Mugabe por graves violações dos direitos humanos, incluindo a eliminação de vários opositores, corrupção e fraude eleitoral, a par de uma contestada reforma agrária particularmente agressiva para os fazendeiros ingleses que ficaram depois da independência da antiga Rodésia.
O Zimbabwe está, aliás, submetido a sanções europeias desde 2002, que impedem, nomeadamente, a entrada na UE de 126 dirigentes, a menos que se trate de participar em reuniões destinadas a manter o diálogo político, o que será o caso da cimeira UE-África.
Portugal, que convenceu os seus pares dos Vinte e Sete a realizar uma primeira cimeira euro-africana em 2000, no Cairo, insiste, desde então, na organização de uma segunda.
Que, de acordo com as conclusões do Cairo, estava prevista para 2003.
O factor Mugabe tem, no entanto, funcionado, desde então, como um obstáculo, pelas mesmas razões que continuam a pôr a cimeira de Dezembro em risco.
Nesta altura, a única coisa que se sabe é que a cimeira se realizará, mas não se sabe como.
Esta certeza resulta da constatação de que a Europa está a perder terreno no continente africano, arruinando décadas de cooperação e ajuda à recuperação dos seus Estados nos planos político, económico e institucional.
A nova tomada de consciência foi precipitada por um factor que funcionou como um sinal de alarme: a entrada em força da China em África na construção de infra-estruturas e na venda dos seus produtos altamente competitivos.
Esta cooperação contraria a tradicional política europeia, pelo facto de não ser acompanhada de quaisquer condicionalismos em termos de democracia, Estado de direito ou respeito dos direitos humanos.
E, enquanto a UE anda desde 2003 às voltas para saber como organizar uma cimeira com África, a China já realizou três.
Seja como for que venha a suceder, o importante é não esquecer que milhares de pessoas morrem todas as semanas e o Zimbabwe está a ser literalmente destruído.
A inflação ultrapassou em Julho os 7600 por cento e o desemprego atinge 80 por cento da população. A esperança de vida desceu para os 36 anos. A fome, até há pouco tempo apenas no campo, chegou às cidades, onde alguns lares ficam sem electricidade durante mais de 18 horas e sem água por mais de duas semanas.
Os problemas vêm de longe, mas a viragem deu-se em 2000, com a política de redistribuição das terras que levou à expropriação dos fazendeiros brancos.